A porta se
abriu. De lá, uma figura estranha foi expulsa sob a escolta de um policial. Ela
caminhava de uma maneira sensual e parecia ter ideia do quão sexy era pelo modo
de caminhar em que aproveitava e dava destaque a cada curva de seu corpo.
As celas se
encontravam vazias, com exceção de uma, que continha uma moça de cabelos
verdes. Bom, deduz-se que a esse ponto, ninguém mais quer ser punido. Pelo
menos, as mulheres não querem.
- É aqui. –
O policial disse com certa sagacidade e um sorriso no rosto. A porta era
relativamente normal, mas o dispositivo conectado à parede próximo à porta sugeria
que ela era reforçada e controlada por computador. Sem chance de fuga.
Apesar de significantemente maior que qualquer outra cela, esta não parecia mais bem-cuidada nem mais confortável. Na realidade, ao contrário de todas as celas anteriores, esta não tinha janelas. Havia várias mensagens subliminares naquele quarto. O banheiro imundo significava a maior delas: Ela não sairia dali, nem mesmo por necessidades. Um beliche havia ali, com apenas um fino lençol. Pode esperar noites geladas. O ursinho de pelúcia foi colocado por pena, clemência por seu estado mental. E era tudo o que havia lá.
Só houve tempo de perceber todos aqueles objetos antes de o policial empurrar a garota no fundo da garganta daquela porta que escondia uma escuridão aterrorizante.
Ela
observou a pequena janela transparente ter a visão impedida e soluçou um choro
quando percebeu estar sozinha. Borrou sua maquiagem, manifestando alguém muito mais
fraco do que parecia ser. Mas aí as luzes foram acesas lentamente, uma por uma,
revelando uma sala pouco menos espaçosa do aparentava ser e muito, muito suja. As luzes agora se encontravam
intensas, mas a sala remanescia escura. A garota deitou-se no chão, com a
expectativa de que tudo ia acabar quando ela acordasse. Mas não acabou.
--- Sete Meses Depois ---
Pela
primeira vez em meses foi percebido o barulho da porta destrancando-se. Seus
mantimentos eram servidos pela janela, que era bloqueada novamente logo após, não se sabe por quem.
Aguardou
por alguns instantes que alguém fosse abrir a porta, mas logo compreendeu que
deveria sair sozinha dali. Passou pelo corredor que agora se encontrava em pior
situação do que a última vez que o viu. A moça de cabelos cor jade não estava
mais ali. Executada? Liberta? Não saberia de verdade nem se a interessasse.
O ar fresco parecia muito diferente desde a última vez que o respirou. Mais pesado. Demorou alguns momentos para que captasse todas as cores sem que seus olhos doessem.
Enquanto vagarosamente
se movimentava em direção à rua, tentou relacionar os pontos que a levaram a
aquela situação.
Fitava o caixão enquanto sentia a chuva a golpear com seus dedos gelados
e mórbidos, passando-os pelas suas costas. Daria tudo para estar no lugar do
cadáver. Morta e abrigada da chuva. Dois coelhos com uma cajadada só.
Ao contrário de todas as outras meninas arrogantes e coloridas, não se
importava com a chuva estragando por completo cada fio de seus cabelos.
Não havia ninguém além dela mesma no sepultamento. Mas pra falar a
verdade, nada no mundo seria mais previsível... Mas por quê?
Porque o falecido, semelhantemente à garota, é um Ritchson. Os Ritchson são a família mais abominada de toda a cidade brilhante e artificial emersa na ilha de Sunlit Tides, que anteriormente era isolada. Agora se tornou o destino de pessoas de todas as classes sociais.
E agora, todo esse ódio pode ser direcionado unicamente a ela, por ser a última sucessora dos Ritchson que ainda permanece viva. Seu pai integrava essa lista juntamente a ela, mas agora, ela está em pé, observando seu local de repouso eterno. Se é que ele terá trégua, pois não descartara a chance de alguém ainda vir ao cemitério cuspir em sua cova.
Supostamente, um golpe colossal resultou em pobreza extrema e a maioria da população passou a ameaçar os responsáveis dessa desgraça em massa. Os Ritchson conseguiram transferir a culpa para o governo, o que os acobertou por um tempo, mas este disfarce logo fracassou, e eles rapidamente emergiram como os verdadeiros culpados.
Ela deu as costas ao caixão ainda aberto.
"Afogue-se", ela pensou.
Caminhar
nunca pareceu tão fácil. Antes que pudesse aproveitar a primeira brisa nos
cabelos em meses, o casarão começava a emergir no horizonte, ainda muito borrado
pelas ondas de calor do asfalto.
Apenas
algumas horas. Era tudo o que pediu e não mais do que recebeu. Seu sono foi por
fim interrompido pela irritante e falha voz, abafada por detrás da porta.
- Sra.
Ritchson? – A voz praticamente cochichou.
Ela
respondeu com um grunhido incompreensível que revelou que parte dela ainda
estava repousando.
- O
representante do tribunal já chegou. – A voz realmente parecia ter temor dela.
- Tomei a liberdade de manda-lo
entrar...
- Jamais
faça isso novamente. – Sua voz soava fraca e sufocada, afinal, eram as
primeiras palavras articuladas em dias. – Mas deixe-o saber que o encontrarei
em poucos instantes.
O que era,
obviamente, uma mentira.
Levariam,
no mínimo, 10 básicos minutos só jogados fora numa ducha quente.
Quando
decidiu ir até a sala, já havia perdido a noção de seu tempo. Num vestido negro
não muito trabalhado, desceu casualmente as escadas e empenhou uma expressão
surpresa para o policial, como se realmente não fizesse ideia do motivo de seu
curso até sua habitação.
Ele
educadamente levantou-se do sofá, onde estava entretido passando a mão no
tecido e observando o fogo na lareira, e colocou uma mão no bolso e estendeu a
outra.
- Muito boa
tarde, senhorita Ritchson. – Ele falou – Podemos?
- Uma coisa
de cada vez, senhor...
- Oh,
perdão, - Ele proferiu ligeiramente constrangido - meu nome é policial
Mackenzie Grant.
Ela sentiu
os olhos do tal homem fixarem-se nos seus. Também observou a pele, de um
aspecto bronzeado artificialmente, tornar-se um pouco mais enrubescida.
- Além
disso – Ela retomou a conversa – pode me chamar de Daveigh. Agora sim, podemos.
Sente-se, por favor.
- Bom então Srta...
Uh... Daveigh... – Ele pareceu um pouco
desconfortável com a intimidade – Sinto dizer, mas... A circunstância não se
encontra muito boa. – Ou talvez a notícia em si seja desconfortável de se dar.
O oficial
abriu uma pasta e de lá retirou um envelope grifado com o nome “Ritchson”, logo
após a palavra “caso”.
- Sua
família...
- Eu, você
quer dizer.
- Voc... A
senhorita responde por desvio de dinheiro e múltiplos homicídios. Sua família
foi acusada anonimamente por funcionários da empresa...
- Quanto
você quer por nomes? – Ela disse num tom mais baixo, evitando que o servente do
outro lado da sala, próximo à porta, ouvisse.
- Perdão? –
O policial deu uma risada um tanto constrangida – Minhas sinceras desculpas,
mas não tenho permissão para aceitar suborno.
- Eu
perguntei quanto você quer. – Ela endureceu a voz, agora mais aquecida e fácil
de controlar.
-
Senhorita...
- Quanto? –
Ela aumentou leve, mas consideravelmente a voz, inclinando-se para frente.
O policial
enrijeceu o olhar de uma maneira súbita e direta e pôs mais seriedade em sua
expressão.
- Seria um
processo complicado – Ele disse, após um longo suspiro – no qual eu posso
terminar muito mal, de modo em que precisarei de uma significativa
contribuição.
- $ 15.000? – Chutou um valor
- $ 25.000,
mínimo. Pegar ou largar.
A garota
não deixou de notar a forte e convicta persuasão e evitou argumentar. Mesmo que
tentasse, acabaria tendo que pagar o
mesmo valor, ou até mesmo mais que isso.
- Eu posso
subornar algumas pessoas para me ajudarem a conseguir o que a senhorita quer em
dois dias. Sigilo total.
Ela desviou
o olhar por um momento, como se estivesse realmente levando algo em
consideração sobre a decisão, mas, no fim, só havia uma resposta. Uma escolha.
- Eu topo.
– Ela respondeu
Os beijos
de Brett não costumavam ser longos. Ele
constantemente parava de beijá-la para olhar dentro de seus olhos. Mas aquele
foi excepcionalmente extenso. Extenso demais.
- O que
foi? – Ele perguntou, ao sentir o corpo da garota forçar a si mesmo para trás,
desprendendo-se dele.
- Eu que pergunto.
– Ela respondeu, uma sobrancelha erguida, peculiar expressão de suspeita.
- Aspen...
- Me diz...
Você veio de sua casa para cá, tarde da noite, quase me fez ter um ataque do
coração quando bateu na janela, se esgueirou para dentro do meu quarto e começou
a me beijar de um modo estranho, e está tudo bem?
- Eu...
- Seis
meses e meio de namoro, Brett. Eu te conheço.
Seguiu-se
um longo silêncio, até que Brett finalmente conseguiu formar as palavras:
- Eu vou
ser pai.
As pupilas de Aspen se dilataram. Começou a levantar a mão em direção à boca, mas começou a tremer mesmo antes de completar o movimento.
- Brett...?
– Ela atirou-se na cama, sentou e fitou o chão. – Não pode ser, Brett... Não
estou preparada! Só aconteceu uma vez...
- Querida... – Seus olhos umedeceram. Tudo o que ele dizia para Aspen era completamente puro e verdadeiro.
– A criança... Não é sua.
Fim do Capítulo I